17 de maio de 2011

Deixar envelhecer os traços ou o que vamos deixando cair

Aquilo que nos define hoje não é de modo algum aquilo que nos definia no inicio da idade adulta, na adolescência ou muito menos na infância.
De entre um leque muito variado de opções, uma das que mais nos define, é aquilo que nos dá prazer (porque o repetimos mais vezes). "Ah e tal, fulano só quer é gajas" (peço desculpa pela expressão, só estou a tentar ilustrar um exemplo da maneira mais verdadeira que conheço) ou, "ela só pensa em comer", "Aqueles passam a vida no cinema", "o meu filho só quer ver televisão", "o meu marido/mulher é viciado no trabalho", etc.
Mas à medida que avançamos na vida, ela muda (e muda-nos), o tempo vai sendo cada vez menos e nós temos que ir seleccionando, temos que ir deixando cair muito daquilo que temos vindo a carregar connosco desde há muito tempo (principalmente porque temos que arranjar espaço para carregar coisas novas).
Talvez seja isso, nem nos vamos dando conta, e, quando um dia nos lembramos, "Ah, eu costumava fazer isto", ou "há tanto tempo que não faço aquilo", talvez seja aí que nos apercebemos que já não somos os mesmos, crescemos, crescemos tantos que... desaprendemos, crescemos tanto que nos perdemos! E só podemos ser aquela pessoa que achamos que somos se fizermos determinadas  coisas, senão, tornamo-nos iguais aos "outros" e envelhecemos. Temos que nos reencontrar.
Eu, na minha vida, sinto falta de principalmente duas coisas, a primeira, estou a tratar do assunto (com muita, muita força) e acho que lá vou conseguindo, é ler. A segunda, penso nela com muita nostalgia, é desenhar. Acho que já nem o sei fazer... desenho à "mão livre", desenho à vista, uma paixão.
Lembro-me com muitas saudades das aulas de desenho do 2º ano da faculdade. Nunca na minha vida eu desenhei tão bem e tão depressa, aquilo parecia uma linha de montagem, produzíamos uma quantidade exorbitante de desenhos por aula (de 2 ou 4 horas).
Andávamos o ano inteiro com blocos A5 "no bolso", tínhamos (e não era nenhuma obrigação) que fazer , pelo menos, um desenho por dia, enchíamos blocos (plural) inteiros. Desenhávamos tudo o que víamos, é às vezes, o que queríamos ter visto.
Desenhávamos naturezas mortas, naturezas vivas, naturezas a dormir. Desenhávamos em casa, no autocarro, no metro, nas escadas, nos cafés, nas salas de espera. Desenhávamo-nos uns aos outros, desenhávamos mãe, pai, tio, prima, gato, sapato.
Pouco houve que não tenhamos desenhado. Na baixa lisboeta por exemplo, poucas devem ser as ruas em que não andámos a desenhar. E no entanto, não me lembro do último desenho que fiz, não me lembro da última vez que peguei num lápis (ou caneta).
Quem sou eu? Quem tenho sido eu nestes anos? Desenhar já não me define. Cá dentro lembro-me de o fazer e faz parte de mim mas ficou lá atrás, algures.
Talvez um dia tente resgatar, afinal, é algo de que tenho muitas saudades (e me dava muito prazer). Também não sei se será isto uma tentativa "desesperada" de nos agarrarmos à juventude, será?
Daqui a uns tempos, quando estiver mais distanciada desta fase, saberei definir (-me).

2 comentários:

  1. Eu lembro-me de um desenho. Caras de bébés. É de 1994 e está pendurado lá em casa. :)

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  2. Vergonhosamente não me lembro desse desenho...

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ideias caídas das nuvens